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Nos tempos da Guerra: A Gripe Espanhola no Brasil (1918-1919

26.05.2020

Por: Mell

Cristiano Enrique de Brum[1]

O presente texto faz parte da coletânea “Sete Males”: Histórias das Doenças, Epidemias e Pandemias no Brasil, organizada por Eduardo Cristiano Hass da Silva, vinculada à Rede Análise COVID – 19.


[1] Doutor em História pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul.

Um século atrás, o mundo se encontrava em guerra por cerca quatro anos quando ela surgiu. Apesar de ter ficado conhecida como “Gripe Espanhola”, até hoje historiadores debatem sua origem. Uma das versões mais aceitas é de que ela tenha começado nos Estados Unidos, em uma área militarizada do Kansas: “talvez o nome tenha permanecido porque a Espanha, ainda neutra, não tivesse censurado as notícias a seu respeito, ao contrário de outros países europeus”. De acordo com Gina Kolata (2002), “na Espanha não era segredo, diferentemente da gripe em outros lugares”.

            Com o estado de sítio decretado em diversos países devido a Primeira Guerra Mundial a doença circulou em todas as partes do mundo e em muitos lugares, inclusive no Brasil, convenientemente foi censurada nos jornais. Não sabiam, seja no Brasil, ou em outros lugares do mundo, que epidemia de 1918 e 1919 seria mais mortal do que os dois conflitos mundiais somados. Cerca de 50 milhões de mortos contabilizados em 2 anos de pandemia

            A guerra mobilizava muitos homens e recursos, assim a primeira onda da doença se espalhou muito devido a circulação de tropas em território europeu. Na Europa epidemia atingiria seu ápice em outubro de 1918, porém, com o cessar das hostilidades em 11 de novembro daquele ano a intensidade da epidemia começou a decrescer. A doença se espalhou para outros continentes e a segunda onda da doença atingiu o Brasil.

            O Brasil que havia entrado na Grande Guerra em 1917 decididiu enviar marinheiros e médicos para a auxiliar seus aliados no conflito. O Brasil já sofria perdas humanas e econômicas com a guerra na época: submarinos alemães haviam naufragado diversos navios brasileiros, porém, com a gripe, as perdas humanas se agravariam muito mais no final de 1918. A Missão Médica Brasileira e os marinheiros da Divisão Naval de Operações de Guerra, que haviam saído do Rio de Janeiro de 18 de agosto no Navio Plata, foram os primeiros a serem atingidos pela epidemia enquanto viajavam para a Europa em Guerra. Uma das vítimas da pandemia foi o médico gaúcho Scylla Teixeira que iria com demais brasileiros para a França auxiliar no atendimento a feridos de guerra. Neste novo momento a pandemia de gripe se tornou um novo inimigo a combater.

            Enquanto alguns brasileiros se dirigiam para Europa em conflito, a doença viajava para o território nacional. Acredita-se que um dos primeiros focos de transmissão iniciou quando a embarcação inglesa Demerara atracou em três portos de nosso país no mês de setembro: Recife, Salvador e Rio de Janeiro. Então, em menos de 2 meses todas as grandes capitais do Brasil estavam em luta contra a pandemia.

            Os governos estaduais e das principais cidades estabeleciam restrição à circulação, emitiam conselhos à população e recolhiam dezenas de mortos diariamente. Os números são inexatos, mas giram em torno de 35 mil vítimas. Até o presidente eleito na época, Rodrigues Alves, acabou falecendo por ter contraído a gripe.

            A epidemia modificou o cotidiano e deixou uma marca na nossa sociedade de início do século XX. E não foi por acaso que o Brasil realizou uma reorganização da sua saúde pública no ano de 1920: a epidemia exigiu a reorganização da antiga Diretoria Geral de Saúde Pública em um novo órgão, agora de abrangência maior, denominado Departamento Nacional de Saúde Pública. Assim, saímos fortalecidos institucionalmente daquele período e a nossa saúde pública teria uma abrangência ainda maior para conter as epidemias e problemas de nossas cidades e sertões. Esperamos que o mesmo aconteça agora, 100 anos depois, e que a nossa saúde pública continue em expansão após a crise que enfrentamos.

Referências:
KOLATA, Gina. Gripe: a história da pandemia de 1918. Rio de Janeiro: Record, 2002, p. 21.

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