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DIA MUNDIAL DA SAÚDE E PARA ONDE ELA IRÁ

07.04.2020

Por: Mell

No dia 7 de Abril, é comemorado o Dia Mundial da Saúde. Criado pela Organização Mundial da Saúde (OMS), em 1948, essa data tem como objetivo conscientizar a população dos diferentes fatores que afetam a saúde da população [1]. Comemorada, pela primeira vez em 1950, cada ano um tema é adotado, tendo como critério a relevância desses fatores para a saúde da população mundial. “Salvar vidas: hospitais seguros em situações de emergência” (2009); “Hipertensão: conheça seus números” (2013); “Do campo à mesa, obtendo alimentos seguros” (2015); “Vamos conversar” (2017, focando na depressão); e “Saúde universal: para todos e todas, em todos os lugares” (2019) foram alguns temas levantados até agora. O ano de 2020 está sendo marcado por desafios inéditos para a nossa geração. Por cobranças em maior atenção à saúde global, mostrando que nossas fronteiras são, cada vez mais, emblemáticas.

A COVID-19 é a nossa preocupação da vez. Quando comparada com outras doenças conhecidas, sua letalidade não aparenta ser tão alta. No entanto, o vírus SARS-CoV-2, responsável pela COVID-19, possui uma alta taxa de transmissão, utilizando vias sofisticadas que asseguram um acelerado contágio que coloca em risco a sobrecarga do sistema de saúde. Para o estabelecimento de estratégias de enfrentamento para a pandemia, bem como para o planejamento de recursos para os sistemas de saúde, modelos epidemiológicos têm sido amplamente usados, por diversos países do mundo, para estabelecer fases epidêmicas baseados nos casos registrados de COVID-19 e predição de como esse comportamento será até o período de remissão viral, quando teremos o controle da doença [2,3].

O estudo de doenças epidêmicas combina conhecimentos acerca da biologia envolvida com os aspectos tanto do agente infeccioso, como o vírus, quanto do hospedeiro, bem como aspectos sociais. As epidemias podem se propagar rapidamente pela população ou não, podendo persistir durante longos períodos de tempo. A partir desses dados e, tendo em vista modelos disponíveis para fazer essa predição, diversas opções estão disponíveis para análise do comportamento da COVID-19. Um dos modelos é o adotado pelo Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC – Centers for Disease Control and Prevention), o principal instituto nacional de saúde pública dos Estados Unidos.

            De acordo com essa projeção, que foi obtida pela adaptação à realidade brasileira do modelo utilizado pelo CDC americano, esperamos ver uma aceleração no número de casos até o final do outono. No momento ainda estamos em um período de epidemias localizadas, mas a curva de infecções ainda deve acelerar. O modelo prevê que cheguemos ao pico das infecções próximo ao final do outono, quando então o número de novos casos começa a reduzir em uma fase de desaceleração que deve durar várias semanas.

Esse estudo prevê três diferentes cenários para a progressão da epidemia dependendo das ações de distanciamento social adotadas: sem distanciamento social; distanciamento social seletivo; distanciamento social ampliado. Em todos os casos, as características das fases de evolução da curva são semelhantes, entretanto a dimensão que a epidemia atinge é marcadamente distinta. O gráfico evidencia uma grande diferença entre o número de casos nos três cenários. Como esperado, quanto maior o distanciamento social, maior a redução no número de casos.

            Uma vez que os estudos para uma vacina efetiva estão com as fases clínicas de teste em andamento e, sem um protocolo terapêutico definido e específico para o vírus SARS-CoV-2 (porém com estudos muito promissores em andamento), as principais variáveis modificadoras das curvas de incidência da COVID-19 se restringem ao isolamento social.

O isolamento social não é uma novidade no mundo animal. Diversas espécies isolam membros de suas comunidades quando esses se apresentam doentes por alguma infecção [5]. É o caso das abelhas e dos chimpanzés, por exemplo. Esse isolamento social seletivo é bastante útil no momento em que todos os integrantes infectados pelo agente infeccioso da espécie em questão são identificados e, a partir daí, isolados. Larvas infectadas, por exemplo, são capazes de emitir sensores como o ácido oleico, que são sensíveis para abelhas que, automaticamente, isolam esses organismos da colméia. Em grandes populações, isso se torna um desafio, uma vez que nossa capacidade de testagem é limitada, especialmente para um organismo infeccioso recente. Um caso bem-sucedido de estratégia para o enfrentamento da pandemia foi usado pela Coréia do Sul, em que a capacidade diagnóstica foi crucial para o enfrentamento. Resumidamente, a Coréia do Sul testou todos os casos, sejam eles sintomáticos ou não. Essa testagem populacional em massa permitiu identificar um grande volume de pessoas infectadas, independente da sintomatologia, e isolá-las rapidamente. A Coréia do Sul aprendeu com seus desafios passados, quando encarou a MERS (Middle-East Respiratory Syndrome) em 2015, mostrando que a testagem laboratorial é essencial para o controle de um agente infeccioso emergente [6]. Mas o que fazer se não temos recursos suficientes para testagem em massa? O que fazer quando mal temos recursos para testar os pacientes sintomáticos?

Esse é o caso do Brasil, e de muitas nações do mundo. Apesar dos imensos recursos de universidades e institutos federais [7], de empresas [8] e do próprio governo federal [9], o número de pessoas infectadas pode ser muito maior do que nossa capacidade de visualização, devido a testagem insuficiente [10]. Levando em consideração esses aspectos, o isolamento social seletivo (ou vertical) não seria viável para a nossa população. Mesmo isolando aqueles que conseguimos testar, estaremos permitindo o fluxo de pessoas assintomáticas e sintomáticas – porém com aspectos leves da doença – elevando ainda mais a transmissão viral. Para esses casos, a solução mais otimista consiste no isolamento social amplo, o qual, segundo as novas recomendação do Ministério da Saúde, deve ser implementado apenas nas cidades em que o número de casos confirmados tenha impactado mais que 50% da capacidade instalada do sistema de saúde local [11]. No entanto, apesar do crescente aumento de casos e do monitoramento municipal das UTIs dos hospitais disponíveis para atendimento apresentarem mais de 50% de lotação em alguns dos municípios, esse isolamento amplo não é adotado com o rigor necessário.

Independente dos pontos de vista acerca de se o isolamento amplo é ou não necessário, os modelos de predição são genuínos e muito confiáveis em apontar o quanto eles são modificadores da curva de número de casos de COVID-19 ao longo do tempo. Ao observar o gráfico do Ministério da Saúde, aplicando o modelo de previsão de fases epidêmicas do CDC (mencionado anteriormente), podemos observar que, sem realizar qualquer ação de distanciamento social, temos um pico elevado entre as semanas epidemiológicas 22-25. Isso se dá ao fato de que não há isolamento de nenhuma pessoa infectada, e há trânsito normal dessas pessoas na sociedade, podendo cada pessoa infectada transmitir para três a quatro pessoas saudáveis e assim, exponencialmente. No momento em que nosso sistema é capaz de diagnosticar a população infectada, tendo testes suficientes para a testagem em massa (e não apenas dos casos sintomáticos graves que chegam aos hospitais, como atualmente é a testagem brasileira), podemos observar que o isolamento seletivo desses pacientes gera uma queda acentuada na taxa de transmissão viral. No entanto, conforme dito, poucas nações possuem tal recurso para poder realizar testagem em massa e, infelizmente, não é o caso do Brasil. Considerando nossa realidade quanto aquisição de novos testes e triagem de casos novos da COVID-19, o isolamento social amplo é a nossa melhor estratégia. Podemos observar que, ao implementá-lo, modificaria a curva de transmissão drasticamente, sendo a principal ferramenta para planejamento de recursos para o sistema de saúde, preparando hospitais para receber pacientes infectados, disponibilizando mais equipamentos de proteção individual (EPI) para os profissionais de saúde, remanejando novos profissionais para abraçar o aumento da demanda hospitalar e, por fim, assistindo os pacientes da melhor forma possível, diminuindo a taxa de letalidade do vírus (a qual aumenta com a redução de assistência médica e hospitalar devido ao colapso do sistema de saúde).

            É importante notar que como todo modelo epidemiológico, esse modelo proposto possui sua margem de erro. Podemos esperar alguma variação em termos dos tempos de duração de cada fase da epidemia, além outras alterações no seu formato devido a variações locais e temporais nas medidas adotadas. Entretanto a mensagem qualitativa desse gráfico é clara: Maiores níveis de distanciamento social levam a reduções no número total de casos e no seu pico. E essa diferença é relevante e influencia diretamente no número de óbitos que teremos.

O vírus é real. A pandemia é real. Infelizmente, a resolução não vai acontecer dentro de um pouco menos de 2h de duração, período que estamos acostumados com os filmes de desastres ambientais e pandêmicos. As soluções são complexas, a ciência necessita de investimento prévio para se preparar em dar respostas rápidas em ocasiões como esta e precisa, mais do que nunca, ser escutada. O aviso já tinha sido manifestado em 2007, quando um grupo de pesquisadores apontou que os vírus relacionados a Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG ou SARS, Severe Acute Respiratory Syndrome) são infecções emergentes e reemergentes [12]. É necessário repensarmos nossos estilos de vida, nossos comportamentos individuais e como espécie e ter em mente que pandemias irão emergir, e que precisamos estar preparados para dar respostas rápidas. Fazemos isso investindo em ciência. Investindo no setor público que está heroicamente respondendo a essa situação. Nós temos propostas de modificadores de curvas que requerem um esforço da população para serem adotadas. No entanto, precisamos pensar em modificadores da nossa trajetória como espécie. Os perigos são emergentes, e temos um a caminho com proporções catastróficas: o aquecimento global. Opiniões não salvam vidas, mas ações embasadas em evidências científicas sim.

1 – https://www.who.int/news-room/campaigns/world-health-day/world-health-day-2020

2 – https://www.sciencedirect.com/topics/medicine-and-dentistry/epidemic-model

3 – http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0037-86822020000100500

4 – https://www.thelancet.com/journals/lanpub/article/PIIS2468-2667(20)30073-6/fulltext

5- https://www.nationalgeographic.com/animals/2020/03/quarantine-social-distancing-bee-chimpanzees/

6 – https://www.sciencemag.org/news/2020/03/coronavirus-cases-have-dropped-sharply-south-korea-whats-secret-its-success

7 – https://agenciabrasil.ebc.com.br/saude/noticia/2020-04/unicamp-busca-financiamento-para-produzir-kit-de-testes-para-covid-19

8- https://jovempan.com.br/noticias/brasil/covid-testes-vale-chegam-brasil.html

9 – https://www.gov.br/pt-br/noticias/saude-e-vigilancia-sanitaria/2020/03/governo-federal-inicia-distribuicao-de-500-mil-testes-rapidos-para-covid-19-na-proxima-semana

10 – https://g1.globo.com/jornal-nacional/noticia/2020/03/31/numeros-da-covid-19-no-pais-podem-ser-maiores-porque-quantidade-de-testes-e-insuficiente.ghtml

11 – https://www.gov.br/pt-br/noticias/saude-e-vigilancia-sanitaria/2020/04/ministerio-da-saude-dispoe-sobre-nova-estrategia-de-relacao-ao-isolamento-social

12 – https://cmr.asm.org/content/20/4/660

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