Autor: Fernando Kokubun , IG @fernandokokubun
Revisão: Jorge Alberto Araujo @JorgeAraujo ; Mellanie F. Dutra (@mellziland)
A pandemia da COVID-19, que é causada pelo novo coronavírus SARS-CoV-2, é ainda muito recente e há ainda muitas dúvidas sobre quais abordagens são efetivas para controlar a pandemia. Entre estas abordagens, uma que é considerada fundamental é a dos testes em um maior número de pessoas e o rastreio dos casos de pessoas infectadas. Estes procedimentos, foram fundamentais para a contenção da pandemia em diversos países. Existem diversos tipos de testes, adequados para diferentes situações da pandemia da COVID-19 [1].
Apesar da sua importância, ainda há dúvidas sobre a confiabilidade dos resultados obtidos com alguns tipos de testes, em especial o chamado teste de anticorpos [2,3], que são recomendados apenas para verificar se a pessoa já teve a COVID-19, mesmo sendo assintomática, assim não é um teste para verificar se a pessoa está com a COVID-19. Para realizar os testes, a recomendação é que sejam realizadas duas semanas após o início dos sintomas. O número de testes de anticorpos disponíveis no mercado é bem elevado, aqui no Brasil, os testes liberados pela ANVISA são 22, e no mundo todo existem 315 testes de diferentes fabricantes registrados até junho [4]. Os testes de anticorpos – conhecidos como testes rápidos – detectam a presença das imunoglobulinas (que são proteínas presentes no corpo humano, comumente conhecidas como os anticorpos) IgM e IgG. A presença de ambas as imunoglobulinas indicam que a pessoa já teve contato com o SARS-CoV-2 [8,9]. Ainda não se sabe se a pessoa com anticorpos estará imunizada de futuras infecções, pois alguns estudos indicam um período muito curto de alguns meses de imunização [3,5]. Na figura 1 , apresentamos as possíveis combinações de resultados obtidos por testes de PCR (que é um outro tipo de teste, sobre o que trataremos mais adiante) e de anticorpos, e suas interpretações. A tabela foi produzida pelo Centro de Saúde da Comunidade da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) [11].
O teste de anticorpos possui uma sensibilidade (capacidade de detectar pacientes que já tiveram COVID-19) de 70% e especificidade (capacidade de detectar pessoas que não tiveram COVID-19) de 98% – para os kits de alguns fabricantes testados no Reino Unido [5]. Isto significa que existe a possibilidade de 30% de se obter falsos positivos e 2% de falsos negativos, para testes realizados 14 dias após o início dos sintomas. No entanto o percentual de falsos positivo e falsos negativos, dependem de outros fatores [6] quanto maior o número de infectados maior a precisão dos resultados [7]. Lembramos que nenhum teste é 100% preciso, de forma que a imprecisão acima não é uma característica exclusiva dos testes de anticorpos.
A imprecisão nos resultados, dependendo da situação não é um problema muito sério, e pode ser contornada com um segundo teste ou considerando o histórico clínico da pessoa testada. Se este paciente obteve um resultado positivo e teve contato com pessoas infectadas, a chance do positivo ser real é bem alta. Por outro lado se a pessoa não teve contatos com pessoas ou locais infectados, a chance desse indivíduo em questão ser um falso positivo é igualmente bem alta [5]. É importante ressaltar que no caso dos testes de anticorpos, o falso positivo é o mais perigoso, pois a pessoa ficaria com a falsa segurança de que, por ter contraído a COVID-19, estaria imunizado de futuras infecções para o SARS-CoV-2. E isto pode levá-la a ter comportamentos de alto risco. Isto é particularmente perigoso para os profissionais das áreas de saúde, que trabalham diretamente com a doença. Sem falar do risco de contrair de fato a doença, um falso positivo pode transformar a pessoa em um vetor de propagação da COVID-19. Neste caso é recomendável realizar o diagnóstico conjuntamente com o histórico clínico do paciente e se necessário um exame de RT-PCR (que é um outro tipo de teste, mas só aplicável quando o SARS-CoV-2 está presente no organismo). Sendo o teste de anticorpos positivo e o RT-PCR negativo, é praticamente certo que a pessoa foi infectada mas que está curada, e com anticorpos.
Apesar das restrições acima, os testes de anticorpos são confiáveis e muito úteis, quando utilizados com outros testes como o RT-PCR, rastreio de pessoas contaminadas e determinação de possíveis clusters de contaminação, para o diagnóstico em grandes populações, e são fundamentais para orientar as ações de políticas públicas de saúde. Ŕessaltamos que a utilização de um único teste ou procedimento, não fornecem informações suficientes para a contenção da pandemia. Para uso individual, as limitações as tornam pouco úteis, mas sendo necessário realizar o teste (existem kits de testes sendo vendidos em farmácias e clínicas) é preciso estar ciente das suas limitações, e somente devem ser utilizados com uma orientação adequada. Principalmente é importante lembrar que ainda não sabemos se o fato de terem sido detectados anticorpos, garante a imunidade para futuras infecções. Alguns estudos indicam que a imunidade duraria por um período de 6 meses a um ano Ademais os assintomáticos possuem um baixo nível de IgG, o que pode indicar um período de imunidade ainda mais curto quando comparado com os sintomáticos [10]. Lembrando que não existem ainda casos de reinfecção por SARS-CoV-2, confirmados de fato, apesar de existirem alguns possíveis casos em análise.
As estimativas de tempo de imunização foram obtidas assumindo uma resposta padrão do nosso sistema imunológico, e considerando respostas semelhantes com casos de gripes e outras infecções. No momento não podemos ignorar que existe a possibilidade da resposta do nosso sistema imune seja diferente com este novo coronavírus. Assim, até termos uma maior compreensão de como ele atua no corpo humano, a prevenção é a melhor solução.
Referencias
[1] COVID-19 diagnostics in context. R. Weissleder et all; Science Translational Medicine, v 12 (546); 03 de junho de 2020. https://stm.sciencemag.org/content/12/546/eabc1931
[2] Pessoas assintomáticas com coronavírus podem ter resposta imune mais fraca. G. Girardi; O Estado de S.Paulo ; 22 de junho de 2020 . https://saude.estadao.com.br/noticias/geral,estudos-dizem-que-imunidade-para-coronavirus-na o-teria-efeito-a-longo-prazo,70003340660
[3] Estudo sobre anticorpos de assintomáticos põe em ‘xeque’ testes rápidos de covid-19, diz cientista. G. Girardi, O Estado de S.Paulo, 22 de junho de 2020. https://saude.estadao.com.br/noticias/geral,estudo-sobre-anticorpos-de-assintomaticos-poe-em -xeque-testes-rapidos-de-covid-19-diz-cientista,70003341307
[4] O número de diferentes tipos de testes liberados em diferentes países, pode ser acessado em https://www.finddx.org/covid-19/pipeline/
[5] Should you pay for a coronavirus test? Here’s what you need to know. M. Le Page; New Scientist , 19 de junho de 2019. https://www.newscientist.com/article/2246514-should-you-pay-for-a-coronavirus-test-heres-what -you-need-to-know/#ixzz6QBxLUQFI
[6]How accurate are the results from self-testing for covid-19 at home? M. Brooks; New Scientist 13 de maio 2020 . https://www.newscientist.com/article/mg24632823-200-how-accurate-are-the-results-from-self-t esting-for-covid-19-at-home/#ixzz6QBwqPcU5
[7] Coronavirus Antibody Tests Have a Mathematical Pitfall . S. L. Frasier; Scientific American Julho 2020 . https://www.scientificamerican.com/article/coronavirus-antibody-tests-have-a-mathematical-pitfa ll/ [8]Fact Sheet For Healthcare Providers. USA Food and Drug Administration; 12 de junho de 2020. https://www.fda.gov/media/136623/download
[9] IgG e IgM positivo para Covid: entenda significado das siglas e diferença entre teste rápido e PCR. Portal G1, 6 de junho de 2020. https://g1.globo.com/bemestar/coronavirus/noticia/2020/06/04/igg-e-igm-positivo-para-covid-ent enda-significado-das-siglas-e-diferenca-entre-teste-rapido-e-pcr.ghtml
[10] Clinical and immunological assessment of asymptomatic SARS-CoV-2 infections. Quan-Xin Long et all; Nat Med (2020). https://rdcu.be/b46IG [11] Cecom amplia exames para detectar Covid-19 a todos os alunos, professores e funcionários. Centro de Saúde da Comunidade Unicamp, 28 de maio de 2020. https://www.cecom.unicamp.br/cecom-amplia-exames-para-detectar-covid-19-a-todos-os-alunos-professores-e-funcionarios/?utm_source=rss&utm_medium=rss&utm_campaign=cecom-amplia-exames-para-detectar-covid-19-a-todos-os-alunos-professores-e-funcionarios